Baseado no livro de Myriam Campello (“Como Esquecer: anotações quase inglesas”), “Como Esquecer”, filme de 2011 dirigido por Malu de Martino, traz um ar melancólico, sufocante e doloroso na busca pessoal por se reencontrar e se reconhecer como indivíduo.
Júlia, interpretada por Ana Paula Arósio, é uma professora universitária de literatura inglesa que acabou de se separar de Antônia, esposa com quem viveu pelos últimos dez anos, de forma repentina e dolorosa. Ao lado de Júlia, na trama principal, somam-se Hugo (Murilo Rosa), ainda em luto pela perda recente do companheiro, e Lisa (Natália Lage), que vive uma relação conturbada com o namorado.
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“Qual é o contrário do amor?” é o questionamento de Júlia que permeia grande parte da trama. A personagem se encontra desolada com o fim do relacionamento, sem saber como continuar sua vida ou quem realmente é sem a ex-esposa por perto – sem saber lidar nem mesmo com a separação das contas do banco. Hugo a convence a se mudar do apartamento em que viveu com a ex, e morar com ele e Lisa numa casa em Pedra de Guaratiba para respirar novos ares.
Completamente relutante com a ideia, mas sem forças para recusar o convite ou continuar vivendo de qualquer forma, Júlia acaba aceitando e começamos a nos aprofundar na complexidade de seus sentimentos. Com ares completamente ingleses, tanto na construção da narrativa quanto na fotografia, o filme é repleto de citações de Emily Bronthë e Virginia Wolf embalando a depressão e o completo caos que se instaura sobre Júlia.
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É neste contexto que surge a personagem de Ariêta Correa, Helena, aos poucos flertando e tentando quebrar a casca da protagonista, enterrada em sua dor e sua falta de ar constante por não achar que pode se enxergar num mundo sem Antônia. O novo interesse amoroso, por sua vez, traz suas próprias dores e lutas pessoais. Vale destacar também a personagem Carmen Lygia (Bianca Comparato), que ganha a tela pelo brilho deslocado que imprime no longa.
A narrativa do filme deixa nítido o tempo todo ser uma adaptação literária, em muitas cenas falhando numa dinâmica mais rápida ou mais bem trabalhada que urge ao se trabalhar com a linguagem audiovisual. Porém, ainda assim, é válido ao mostrar como trabalha a sua representatividade: ter uma personagem principal sáfica se torna segundo plano na trama, nunca sendo o drama principal a questão da sexualidade, mas a busca por si própria após um longo período de auto-apagamento.
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Principalmente do meio para o final, o filme vai deixando de lado o tom longamente melancólico e quase ultrarromântico, bastante inspirado em “O Morro dos ventos uivantes”, e vai construindo uma bela história de redescobrimento – pelo romance, pela retomada da paixão pelo trabalho, por um reencontro com o mar.
Aprendemos ao lado de Júlia – e de Hugo – que somos seres humanos completos para além de uma vida que foi dívida e agora parece perdida – e que podemos viver para além de um abandono ou da perda de quem amamos. O desfecho do filme é um tanto quanto diferente do que o aguardado e foge dos clichês de que a cura vem do outro, de que um amor antigo apenas se supera ao se engatar um novo amor.
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“Como Esquecer”, apesar de sua narrativa lenta e de linguagem um tanto diferente do que estamos habituadas no cinema nacional e norte-americano, pode ser uma experiência reflexiva e engrandecedora para quem quer refletir sobre quais os nosso próprios limites entre o “eu” e o “outro”, sobre quem é o “nós” ao dividirmos a vida com alguém. E, principalmente, para nos lembrar de que precisamos sempre achar o nosso “eu”.