“Falsas Aparências” é um filme de 2005 que conta a história de Susan Trinder (Sally Hawkins), uma ladra órfã criada por um casal dono de uma taberna que vive de pequenos golpes. Maud Lilly (Elaine Cassidy) também perdeu os pais ainda bebê e foi levada para morar com o tio rico quando já tinha mais ou menos dez anos. A primeira cresceu nos becos sujos de Londres, jogando cartas e praticando pequenos furtos; a segunda passou a infância e a adolescência trancada em uma mansão no interior da Inglaterra, copiando livros a mão e fazendo leituras para clientes em potencial do tio. Aparentemente, só o que as duas têm em comum é o fato de suas mães terem morrido de forma trágica: a de Susan foi enforcada como punição de sua conduta criminosa; a de Maud foi internada em um manicômio, onde deu à luz a menina e morreu. Mas Susan se vê envolvida em um golpe para arrancar dinheiro de Maud e então coisas inesperadas acontecem.
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Susan vai trabalhar como aia (dama de companhia) de Maud como parte de um plano que tinha como objetivo casar a rica herdeira com o falso aristocrata sedutor Richard Rivers (Rupert Evans (II)) e então mandá-la para o manicômio, refazendo os passos de sua mãe. Diante da tentação do dinheiro que lhe permitiria mudar de vida, Susan aceita seu papel. No entanto, mesmo antes de tomar a carruagem que a levaria à mansão, ela tem dúvidas se está fazendo a coisa certa, teme ser enforcada se o golpe der errado. No fim, calcula que o dinheiro não só melhoraria sua condição de vida, como também ajudaria imensamente Mrs. Sucksby (Imelda Staunton), a dona da taberna que criava crianças indesejadas.
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Mas o destino adora pregar peça nas pessoas, não é? Ao conhecer a frágil e tímida Maud, Susan se sente mal pela desgraça que aguarda a patroa, a culpa a corrói e ela quer desistir do plano. Só que Richard não está nada disposto a abrir mão de uma fortuna por causa do sentimentalismo dos outros, e ameaça Susan, obrigando a moça a seguir o que haviam combinado. E tudo corre como o previsto. Pelo menos até a metade da história, quando uma reviravolta sensacional mostra o quanto o espectador estava equivocado sobre alguns personagens.
O ponto forte de “Falsas Aparências” é a relação que se estabelece entre Susan e Maud. A moça rica, que supostamente teria uma vida melhor, não passa, no fundo, de uma prisioneira em seu castelo cristal. Com uma rotina rígida de trabalho, seus únicos momentos de lazer se resumem às visitas de Mr. Rivers, que lhe dá aulas de pintura. Não à toa, ela vê nele um salvador. Mas a chegada de Susan coloca as coisas sob uma nova perspectiva. As moças desenvolvem uma cumplicidade que vai além da esperada entre patroa e empregada: elas passam a ser amigas, e, consequentemente, amantes. E mesmo quando parece que cada uma está cuidando dos seus próprios interesses, totalmente alheia ao que acontece à outra, a realidade não é bem essa. Elas desafiam seus destinos para se ajudar mutuamente. Mrs. Sucksby também é outra personagem feminina forte – de fato, toda a trama se desenrola graças às ações dessas três mulheres, que, de alguma forma, quebram regras e colocam a si mesmas em perigo para o bem-estar das outras, que se sujeitam a fazer o que não querem apenas para sobreviver, mas que não deixam, jamais, de tentar virar o jogo.
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“Falsas Aparências” é uma minissérie da BBC em dois capítulos baseada no livro “Na ponta dos dedos” (Fingersmith), da escritora galesa Sarah Waters, que escreve, em sua maioria, histórias com temática lésbica. A trama se passa na Era Vitoriana e a atmosfera de pobreza londrina vs opulência do interior inglês evoca as narrativas de Charles Dickens. Em 2016, o diretor Park Chan-wook filmou “A Criada” (Handmaiden), sua versão da história, transportada para a Coreia do Sul da década de 1930.